Trata-se de Ação Ordinária proposta por UNIMED DE JUNDIAÍ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO em face do CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO ,
objetivando provimento jurisdicional para o fim de i ) “declarar a nulidade do Auto de Infração que resultou na aplicação das multas indicadas, bem como declarar a inexistência de farmácia no pronto
atendimento da Autora, reconhecendo a existência do dispensário de medicamentos;” ii) “determinar a restituição dos valores cobrados pelo Ré a título de multas no total de R$ 9.263,98 (nove mil, duzentos e
sessenta e três reais e noventa e oito centavos), o qual deverá ser atualizado até a data do efetivo pagamento e acrescido de juros legais a partir da citação;” e iii) “anular a decisão administrativa proferida
sobre o assunto em desfavor da Autora, pelos motivos elencados, condenando a Ré, ao final, no pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios.”
Narra a autora, em suma, ser cooperativa médica regulada pela Lei n. 5.764/71 e exerce cotidianamente as suas atividades voltadas à assistência médica hospitalar e no seu hospital mantém uma farmácia, “cuja licença de
funcionamento está vinculada ao processo n. 26.856/08 da Secretaria Municipal da Saúde – Vigilância Sanitária de Jundiaí, com o respectivo Registro de Responsabilidade Técnico junto ao réu ”. Afirma que na
unidade de Pronto Atendimento, mantém apenas um dispensário de medicamentos, os quais serão utilizados por seus beneficiários/pacientes a curto prazo, mediante prescrição médica.
Alega que, no dia 18/10/2016, houve uma fiscalização e os fiscais do Conselho atuaram o Pronto Atendimento 24 horas da autora por suposta infração porque não havia no local responsável técnico farmacêutico registrado
perante o CRF-SP.
Sustenta que o dispensário de medicamente constante do Pronto Atendimento 24 horas não se confunde com uma farmácia hospitalar, não havendo, portanto, a necessidade e obrigatoriedade da assistência de um
profissional de farmácia.
A apreciação do pedido de liminar foi postergada para após a vinda da contestação (ID 1304902).
Citado, o Conselho Regional de Farmácia apresentou contestação (ID 1768486). Alega, em suma, que a Lei n. 13.021/2014 trouxe novas classificações às farmácias, rechaçando qualquer dúvida quanto a sua
aplicabilidade aos referidos estabelecimentos. Assim, sustenta que o dispensário de medicamentos, antes previsto na Lei n. 5.991/73, como sendo o setor de fornecimento de medicamentos industrializados, privativo de
pequena unidade hospitalar ou equivalente, deixou de existir com o advento da nova lei, haja vista que todas as unidades de dispensação de medicamentos, conforme noticiado, sofreram uma reclassificação, de modo que as
farmácias agora são classificadas: a) farmácia sem manipulação ou drogaria e b) farmácia com manipulação. Ao final, pugnou pela improcedência da ação.
O pedido formulado em sede de tutela provisória restou deferido, conforme decisão de ID nº 1789416.
Foi apresentada réplica, oportunidade em que a autora informou não ter provas a produzir (ID nº 2079164).
Instado, o Conselho deixou transcorrer in albis o prazo para especificação de provas, consoante certidão de ID nº 2100578.
É o relatório.
Fundamento e DECIDO.
A questão sobre a (des)necessidade de contratação do farmacêutico como responsável técnico do chamado dispensário de medicamento encontrava-se pacificada na jurisprudência em razão do julgamento pelo C. Superior
Tribunal de Justiça do Recurso Especial nº 1.110.906/SP, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, tendo sido firmada a tese de não obrigatoriedade de contração do referido profissional.
“..EMEN: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. DISPENSÁRIO DE
MEDICAMENTOS. PRESENÇA DE FARMACÊUTICO. DESNECESSIDADE. ROL TAXATIVO NO ART. 15 DA LEI N. 5.991/73. OBRIGAÇÃO POR REGULAMENTO. DESBORDO DOS
LIMITES LEGAIS. ILEGALIDADE. SÚMULA 140 DO EXTINTO TFR. MATÉRIA PACIFICADA NO STJ. 1. Cuida-se de recurso especial representativo da controvérsia, fundado no art. 543-C do Código
de Processo Civil sobre a obrigatoriedade, ou não, da presença de farmacêutico responsável em dispensário de medicamentos de hospitais e clínicas públicos, ou privados, por força da Lei n. 5.991/73. 2 . Não
é obrigatória a presença de farmacêutico em dispensário de medicamentos, conforme o inciso XIV do art. 4º da Lei n. 5.991/73, pois não é possível criar a postulada obrigação por meio da interpretação
sistemática dos arts. 15 e 19 do referido diploma legal. 3. Ademais, se eventual dispositivo regulamentar, tal como o Decreto n. 793, de 5 de abril de 1993 (que alterou o Decreto n. 74.170, de 10 de junho de
1974), fixar tal obrigação ultrapassará os limites da lei, porquanto desbordará o evidente rol taxativo fixado na Lei n. 5.991/73. 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de
que não é obrigatória a presença de farmacêutico em dispensário de medicamentos de hospital ou de clínica, prestigiando - inclusive - a aplicação da Súmula 140 do extinto Tribunal Federal de
Recursos. Precedentes. 5. O teor da Súmula 140/TFR - e a desobrigação de manter profissional farmacêutico - deve ser entendido a partir da regulamentação existente, pela qual o conceito de dispensário
atinge somente "pequena unidade hospitalar ou equivalente" (art. 4º, XV, da Lei n. 5.991/73); atualmente, é considerada como pequena a unidade hospitalar com até 50 (cinquenta) leitos, ao teor da
regulamentação específica do Ministério da Saúde; os hospitais e equivalentes, com mais de 50 (cinquenta) leitos, realizam a dispensação de medicamentos por meio de farmácias e drogarias e, portanto,
são obrigados a manter farmacêutico credenciado pelo Conselho Profissional, como bem indicado no voto-vista do Min. Teori Zavascki, incorporado aos presentes fundamentos. 6. Recurso sujeito ao regime
do art. 543-C do CPC, combinado com a Resolução STJ 08/2008. Recurso especial improvido. ..EMEN: (RESP 200900161949, HUMBERTO MARTINS, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJE DATA:07/08/2012
DECTRAB VOL.:00217 PG:00016 RSTJ VOL.:00227 PG:00196 ..DTPB:.)”
Assim, em conformidade com a decisão supra, o dispensário de medicamento, entendido esse como a pequena unidade hospitalar com até 50 (cinquenta) leitos, está dispensado de manter profissional farmacêutico.
Ocorre que em 11/08/2014 foi publicada no Diário Oficial da União a Lei nº 13.021, que dispõe sobre o exercício e a fiscalização das atividades farmacêuticas, tendo sido utilizada como um dos fundamentos para a
confecção do auto.
A edição da referida lei acarretou nova cizânia jurisprudencial, com precedentes dos Tribunais Regionais Federais ora no sentido de que a norma não alterou o tratamento conferido aos dispensários de medicamentos (AG
00084645920164020000, MARCELO PEREIRA DA SILVA, TRF2 - 8ª TURMA ESPECIALIZADA; AC 00013721220154058300, Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, TRF5 - Segunda Turma,
DJE - Data::06/05/2016 - Página::90), ora no sentido de que restou superada a jurisprudência do C. STJ, impondo-se, assim, a presença do profissional farmacêutico (AC 00479321820124039999,
DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, TRF3 - QUARTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/02/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO; AC 01069182020144025117, SERGIO SCHWAITZER,
TRF2 - 7ª TURMA ESPECIALIZADA.)
Diante desse cenário juridicamente controverso, assume relevância precedente do próprio Superior Tribunal de Justiça de que não restou superada a tese firmada quando do julgamento do Resp. 1.110.906/SP.
Nesse norte:
“..EMEN: TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA DE ESTABELECIMENTO FILIAL
SITUADO NO MESMO ESTADO SOB A JURISDIÇÃO DO CONSELHO PROFISSIONAL A QUE ESTÁ SUBMETIDA A ESTABELECIMENTO MATRIZ. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. ART. 22
DA LEI N. 3.820/1960, DO ART. 36, § 2º, DA LEI N. 5.991/1973, DO ART. 5º DA LEI N. 12.514/2011, DO ART. 5º DA LEI N. 13.021/2014 E DO ART. 969 DO CÓDIGO CIVIL. 1. Recurso especial no qual se
discute se o estabelecimento filial, mesmo sendo autônomo no que pertine a relação jurídico-tributária com o estabelecimento matriz, tem obrigatoriedade de se inscrever no Conselho Regional de Farmácia
com o devido pagamento das respectivas anuidades. 2. Por força do art. 22 da Lei n. 3.820/1960, do art. 36, § 2º, da Lei n. 5.991/1973, do art. 5º da Lei n. 12.514/2011, do art. 5º da Lei n. 13.021/2014 e do
art. 969 do Código Civil, a prestação de serviços ou a venda de produtos relacionados à área farmacêutica gera a obrigação de pagamento da anuidade tanto ao estabelecimentos sede como ao filial,
independente de estarem sob a jurisdição de um mesmo Conselho Regional de Farmácia. 3. Se o Sindicato autor está a substituir as sociedades empresárias do ramo varejista de medicamentos é certo que
todas essas sociedades, bem como suas filiais, têm a necessidade de ter um profissional da área farmacêutica em qualquer um de seus estabelecimentos, uma vez que exploram serviços para os quais são
necessárias atividades de profissionais farmacêuticos, seja na sede, seja na filial, e, por isso, independentemente da forma de constituição do capital social do estabelecimento, deve-se pagar anuidade ao
Conselho Regional de Farmácia, mesmo que sede e filiais estejam sob a mesma jurisdição. 4. Entendimento do qual só se excepciona o dispensário de medicamentos de pequena unidade hospitalar (art. 4º,
inciso XIV, da Lei n. 5.991/1973), conforme decidiu a Primeira Seção do STJ, por ocasião do julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.110.906/SP. 5. Recurso especial provido. ..EMEN: (RESP
201401785968, BENEDITO GONÇALVES, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:01/09/2015 ..DTPB”
Constou do voto do relator, o Ministro Benedito Gonçalves, que:
“E, a propósito, deve-se mencionar que a superveniência da Lei n. 13.021/2014 em nada alterou o entendimento firmado pela Primeira Seção[1], porquanto, nos termos do art. 3º:
Farmácia é uma unidade de prestação de serviços destinada a prestar assistência farmacêutica, assistência à saúde e orientação sanitária individual e coletiva, na qual se processe a manipulação e/ou
dispensação de medicamentos magistrais, oficinais, farmacopéicos ou industrializados, cosméticos, insumos farmacêuticos, produtos farmacêuticos e correlatos.
Enquanto que no art. 4º, inciso XV, da Lei n. 5.991/1973, dispensação é ato de fornecimento ao consumidor de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, a título remunerado ou não.”
Forte nessa premissa, porque exauriente a análise da questão quando da apreciação do pedido de liminar, decisão proferida pela MM. Juíza Federal Substituta Tatiana Pattaro Pereira, adoto aqueles mesmos fundamentos
para tornar definitiva a decisão.
A Lei 3.820/1960, regulamentada pelo Decreto 85.878, de 07 de abril de 1981, criou os Conselhos Federal e Regional de Farmácia, que assumem forma de autarquia de personalidade de direito público, com
autonomia administrativa e financeira.
Consoante o art. 10, da Lei 3.8320/1960, é atribuição do Conselho Regional de Farmácia, em síntese, a fiscalização do exercício da profissão de farmacêutico.
Dito isso, cumpre observar que, com a superveniência da Lei 6.839/1980, ficou patenteada a competência dos conselhos de classe para o registro de pessoas jurídicas que executem atividades submetidas ao
poder disciplinar dos mesmos, assim rezando seu art. 1º: "O registro de empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados, serão obrigatórios nas entidades competentes para
a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros". Assim, estará sujeita à fiscalização dos conselhos profissionais a
empresa que execute atividade-fim ligada ao objeto fiscalizado, bem como as pessoas físicas graduadas que executem serviços assim correspondentes.
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 02/05/2018
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